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Amazonas

Ponte que desabou no Amazonas tinha nota 4 de um máximo de 5 em inspeção do Dnit

Pela nota atribuída, o entendimento era que não havia sinais de “insuficiência estrutural” e que a obra não tinha “problemas importantes”.

O jornal Folha de S. Paulo informou nesta segunda-feira que uma ficha de inspeção técnica do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) atribuiu uma nota 4, de um máximo de 5, à ponte na BR-319 que desabou, matou quatro pessoas e deixou 14 feridos.

A informação foi repassada pelo próprio órgão, vinculado ao Ministério da Infraestrutura, ao MPF (Ministério Público Federal) no Amazonas.

Pela nota atribuída, o entendimento era que não havia sinais de “insuficiência estrutural” e que a obra não tinha “problemas importantes”, sem “nada a fazer” em termos de ações corretivas.

A Procuradoria investiga a queda de duas pontes na BR-319 num intervalo de dez dias. Cobrado a se explicar, o órgão do governo federal apresentou respostas a questionamentos do MPF no último dia 20.

À Folha, o Dnit afirmou que a nota da ponte era 3. “Haveria danos gerando alguma insuficiência, mas não há sinais de comprometimento da estabilidade da obra”, disse.

A primeira ponte, sobre o rio Curuçá, desabou em 28 de setembro. Pelo menos sete veículos despencaram e ficaram submersos no rio. Foi nesse desabamento que morreram quatro pessoas.

Dez dias depois, no último dia 8, desabou uma segunda ponte, sobre o rio Autaz Mirim. A queda isolou 100 mil pessoas na região atingida.

As duas pontes são responsabilidades do Ministério da Infraestrutura e do Dnit. O pedido de explicações feito pelo MPF se refere ao primeiro desabamento.

O Dnit afirmou, na resposta à Procuradoria, que “não houve nenhuma identificação de possíveis riscos de desabamento da ponte”. Segundo o órgão federal, não houve sinal de alerta por nenhuma das três empresas com contratos relacionados ao trecho da BR-319 onde estavam as duas pontes.

“A referida ponte sobre o rio Curuçá possuía a nota 4, de um máximo de 5, conforme a sua ficha de inspeção técnica”, disse no ofício ao MPF.

A ficha e uma explicação técnica sobre o significado da nota foram enviadas em anexo ao ofício. Uma ponte com nota 4 tem “alguns danos”, mas sem sinais de que comprometam sua estrutura; requer apenas serviços de manutenção, sem ação corretiva; e tem boas condições de estabilidade.

Não foi esta a realidade encontrada por técnicos de empresas contratadas pelo Dnit na véspera do desabamento. Num relatório, os técnicos apontaram situação crítica de pontos da estrutura e riscos aos motoristas.

Os fiscais encontraram deficiências estruturais no bueiro e trincas e fissuras nos pilares próximos. No começo da tarde do dia 27 de setembro, foi feito um serviço de “aterro da galeria no encabeçamento sul da ponte”, conforme a resposta do Dnit ao MPF.

A PRF (Polícia Rodoviária Federal) foi acionada para um controle do tráfego na região, diante dos problemas detectados na ponte do rio Curuçá.

“O tráfego começou a ser controlado em meia pista pela [empresa] executora e supervisora, com travessia apenas de veículos leves”, disse o Dnit ao MPF.

No começo da manhã do dia 28, a ponte desabou. Em uma das primeiras notas divulgadas sobre o desabamento, o Ministério da Infraestrutura atribuiu a culpa a caminhoneiros que trafegavam pelo local.

Aimprensa informou, no dia 11, que o Dnit sabia, há mais de nove meses, que o trecho da BR-319 estava em “situação calamitosa”, com “riscos iminentes” aos motoristas e em situação de emergência.

O órgão dispensou licitação e contratou uma empresa para recuperar erosões em caráter emergencial no trecho da rodovia, no Amazonas, a um custo de R$ 33,8 milhões.

A empresa é a A G O Engenharia de Obras, sediada em Medianeira (PR). Além do contrato para cuidar das erosões, ela era responsável pela manutenção do trecho, em contratos que somam R$ 95 milhões.

Por falta de execução, os contratos de manutenção foram rescindidos pelo Dnit, 26 dias antes do desabamento das pontes. Uma nova empresa só foi contratada para serviços de manutenção em 21 de setembro, 19 dias depois das rescisões e uma semana antes da queda. O contrato de recuperação das erosões também foi rescindido pelo órgão federal.

Ao todo, a empresa teve sete contratos rescindidos pelo órgão em setembro e outubro, no valor de R$ 279,5 milhões. Todos eles foram assinados no governo Jair Bolsonaro (PL).

Cinco dias após o desabamento da segunda ponte, o Dnit decidiu punir a A G O, em razão de descumprimento do contrato de manutenção do trecho da BR-319. O órgão do governo federal aplicou uma multa de R$ 971,1 mil e impediu a empresa de novas licitações e contratos por um ano. O MPF cobrou do Dnit uma explicação sobre os contratos com a A G O.

O órgão afirmou à Procuradoria que apenas 36,91% do contrato para recuperação de erosões foram executados, “não havendo assim conclusão integral do mesmo”.

Os documentos enviados ao MPF mostram que existia um “processo erosivo avançado” no km 23,11, que é exatamente o quilômetro onde estava a ponte sobre o rio Curuçá. O serviço no quilômetro aparece como “não executado” pela A G O.
“O contrato foi celebrado em pleno inverno amazônico, final de janeiro de 2022, e a fiscalização autorizou somente parte dos serviços devido à água dos rios estar sobre a pista. A rescisão se deu por término do prazo de execução”, disse a empresa, em nota. “Não há pagamento antecipado, somente se paga aquilo que é medido e atestado pela fiscalização do Dnit.”

A A G O disse não ter sido acionada para recuperar erosão no km 23,11. “Não há nenhuma relação com a queda da ponte. A A G O não tinha nenhum contrato de manutenção no dia anterior à queda.” Em nota, o Dnit afirmou que investiga as causas do desabamento e os responsáveis pelo que ocorreu. “Sobre a empresa A G O, os contratos foram encerrados e processos de apuração de responsabilidade foram instaurados, culminando em penalidades à empresa.”
Uma passagem “seca” sobre o rio Autaz Mirim foi concluída e o tráfego foi liberado, conforme o órgão. “Com relação à transposição sobre o rio Curuçá, o Dnit já executou os acessos necessários para a atracação da balsa que irá realizar a travessia”, disse.


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