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Justiça Federal cancela garimpo com mais de mil hectares em área protegida de Itaituba (PA)

A sentença atendeu parcialmente pedidos do Ministério Público Federal (MPF) feitos em ação civil pública.

Garimpos no alto e médio curso provocam poluição até a foz do Tapajós – Foto: Erik Jennings

A Justiça Federal em Itaituba, sudoeste do Pará, cancelou o licenciamento de um garimpo de mais de mil hectares dentro da Área de Preservação Ambiental (APA) do Tapajós. O local foi licenciado pelo município de Itaituba, apesar da APA atingir território de outros três municípios, Jacareacanga, Trairão e Novo Progresso. Para a Justiça, o potencial poluidor da atividade garimpeira é grande demais e de alcance regional, o que impede o licenciamento pelo município.

A sentença atendeu parcialmente pedidos do Ministério Público Federal (MPF) feitos em ação civil pública contra o garimpo licenciado em favor de Ruy Barbosa de Mendonça, sem a exigência da elaboração de estudos de impactos ambientais. O licenciamento foi feito para quatro áreas diferentes, todas menores do que 500 hectares, que, somadas, ultrapassam mil hectares. Para a Justiça Federal, o fracionamento das licenças é uma estratégia de burla à legislação.

“Certamente, as licenças expedidas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Itaituba carecem de legalidade, uma vez que a apreciação do licenciamento das atividades de lavra garimpeira requeridas por Ruy Barbosa Mendonça é de atribuição da Semas/PA (Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade), tendo em vista que o impacto causado excede o âmbito local, seja pela extensão das áreas, seja por exceder os limites de territoriais um município, seja pelo alto potencial degradador da atividade licenciada”, diz a sentença do juiz Marcelo Garcia Vieira.

Na sentença, a Justiça Federal declarou, incidentalmente, a inconstitucionalidade da resolução 162/2021 do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) que delegou aos municípios o licenciamento de atividades minerárias. Essa declaração só é válida para o caso tratado no processo, mas abre um precedente importante para que se questione a legalidade de outros garimpos que causam danos regionais, mas são licenciados como se tivessem impacto apenas local (dentro do próprio município). Tanto a legislação federal quanto a legislação estadual incluem as atividades minerárias de todos os tipos como de alto potencial poluidor.

Garimpo triplicou – Na última década, as atividades de mineração localizadas na Bacia do Tapajós, sofreram um aumento alarmante de mais de 200%. No ano de 2010, área ocupada pelos garimpos era de 21.437 hectares, sendo que, no ano de 2020, essa área foi ampliada para mais de 68 mil hectares, segundo dados coletados pelo professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) Pedro Walfir, disponíveis no site MapBiomas. No início de 2022, imagens da praia de Alter do Chão, na foz do Tapajós, poluída por rejeitos de garimpo, rodaram o mundo.

A sentença cita também o laudo 91/2018 da Polícia Federal, que detectou risco de assoreamento do rio Tapajós pela magnitude dos sedimentos depositados pelos garimpos, legais ou ilegais, nos afluentes do rio. “Considerando que o aporte de sedimentos tem como origem os garimpos de aluvião, e que esse aporte, no leito do rio Tapajós, é em volume muito significativo, o assoreamento da calha do rio Tapajós é uma questão de tempo. Como foi mostrado, se extrapolado para um ano o aporte é da ordem de 7 milhões de toneladas de sedimentos por ano, o que certamente tem grande potencial de dano”, diz o laudo.

Normativa inconstitucional – “Para evitar desastres irreversíveis, mitigar os impactos ambientais e garantir um desenvolvimento sustentável, compatibilizando o fomento de atividades de exploração dos recursos minerais e a preservação do meio ambiente hígido, que a Constituição Federal de 1998 incumbiu ao Poder Público em todos os espaços federados o dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado”, lembra a sentença.

“Claramente, observa-se que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Itaituba extrapolou os limites impostos pela Lei Complementar nº 140/2011 (…) ao realizar o licenciamento de atividade que causa impacto ambiental que excede o âmbito local, considerando o porte, potencial poluidor e a natureza da atividade desenvolvida na APA do Tapajós”, diz a sentença.

Para a Justiça Federal, “é patente à afronta pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente do Estado do Pará ao dispositivo constitucional para fins de subverter de por meio de normativo infralegal a lógica do sistema cooperativo em matéria de proteção ambiental por meio do desvirtuamento e desrespeito aos parâmetros fixados pela Lei Complementar nº 140/2011 e a Lei n. 6.938/1981, instituidora da Política Nacional do Meio Ambiente e do Sistema Nacional do Meio Ambiente”.

Caso específico – A sentença foi assinada em fevereiro desse ano, mas só foi comunicada ao MPF, oficialmente, em abril. Ela ordena que, no caso específico do garimpo de Ruy Barbosa de Mendonça, o processo de licenciamento deverá ser submetido à Semas e também ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), gestor da Apa do Tapajós.

O município de Itaituba fica proibido de licenciar atividades garimpeiras em favor de Ruy Barbosa Mendonça e deve encaminhar os processos de licenciamento requeridos por ele para o órgão ambiental estadual. O réu também foi obrigado a requerer os licenciamentos perante à Semas, apresentando os estudos de impacto ambiental. O Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), hoje Agência Nacional de Mineração (ANM), também fica proibida de conceder guias, autorizações ou permissões em favor do réu, sem o devido licenciamento ambiental pelo estado do Pará.


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