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Após 400 anos, Barbados rompe com monarquia britânica e celebra nova república

A governadora-geral Sandra Mason – uma respeitada ex-jurista de 73 anos – foi empossada como presidente, 55 anos depois que Barbados declarou independência dos britânicos.

Presidente de Barbados, Sandra Mason. (Foto Jeff Mitchell_Getty Images)

Aos primeiros minutos desta terça-feira, 30/11, Barbados cortou seus últimos laços remanescentes com a monarquia britânica após quase 400 anos. Na cerimônia que começou na noite de segunda-feira (29), o príncipe Charles reconheceu a “aterradora atrocidade da escravidão” enquanto a nação removeu a rainha Elizabeth II do cargo de chefe de Estado e empossou sua primeira presidente.

As festividades oficiais que marcaram a histórica transição da ilha de reino para república aconteceram na Praça dos Heróis Nacionais, que foi decorada com as cores nacionais de amarelo dourado e azul ultramarino, no coração da capital Bridgetown.

O herdeiro do trono britânico veio de Londres para a ocasião e observou a bandeira do Estandarte Real do Reino Unido ser baixada do mastro enquanto o novo Estandarte Presidencial foi erguido em seu lugar.

Momentos depois, a própria ex-representante da rainha, a governadora-geral Sandra Mason – uma respeitada ex-jurista de 73 anos – foi empossada como presidente pelo Chefe de Justiça. Passaram-se exatamente 55 anos desde que Barbados declarou independência dos britânicos.

“Tendo uma noção clara de quem somos e do que somos capazes de alcançar, no ano de 2021, viramos agora a proa do nosso navio em direção à nova república. Fazemos isso para que possamos aproveitar completamente a nossa soberania”, disse Mason em seu primeiro discurso como presidente.

“Por décadas, temos debatido sobre a transição de Barbados para uma república. Hoje, o debate e as conversas se tornaram ação. Hoje, damos um novo rumo à nossa bússola.”

Depois de receber uma saudação de 21 tiros para marcar a mudança histórica, Mason concedeu a maior honraria do país, a Ordem da Liberdade, ao Príncipe de Gales – uma medida para destacar a relação estreita e contínua entre Barbados e o Reino Unido.

Refletindo sobre o comércio transatlântico de escravos
O príncipe Charles disse que ficou “profundamente comovido” por ter sido convidado a participar das comemorações antes de refletir sobre o processo prolongado que a nação insular de quase 300 mil habitantes passou para se tornar uma república.

Ele disse ao povo de Barbados: “A criação desta República oferece um novo começo, mas também marca um ponto num processo contínuo – um marco na longa estrada que vocês não apenas percorreram, mas que construíram.”

“Desde os dias mais sombrios do nosso passado, e a atrocidade aterradora da escravidão, que mancha para sempre a nossa história, o povo desta ilha forjou seu caminho com extraordinária fortaleza. Emancipação, autogoverno e independência foram seus pontos de referência. Liberdade, justiça e a autodeterminação têm sido seus guias”, disse ele.

“Sua longa jornada trouxe vocês a este momento, não como seu destino, mas como um ponto de vista a partir do qual se pode contemplar um novo horizonte.”

A decisão de Barbados marca a primeira vez em quase três décadas que um reino optou por remover a monarca britânica como chefe de Estado. A última nação a fazê-lo foi a ilha de Maurício em 1992. Como esse país, Barbados pretende permanecer parte da Commonwealth (Comunidade das Nações) – uma organização de 54 membros, em sua maioria ex-territórios britânicos, destinada a fomentar a cooperação e o comércio internacional.

Charles, que chegou na tarde do domingo como convidado de honra da primeira-ministra Mia Amor Mottley, também falou de seu longo relacionamento com a nação, tendo visitado pela primeira vez há cinco décadas. Ele foi interrompido por aplausos após dizer que sempre se consideraria um amigo de Barbados.

“Esta noite vocês escrevem o próximo capítulo da história de sua nação, acrescentando ao tesouro de realizações passadas, empreendimento coletivo e coragem pessoal que já enchem suas páginas”, disse ele ao encerrar seu discurso.

“A história de vocês é uma em que cada barbadiano, jovem e velho, pode ter o maior orgulho – inspirado pelo que veio antes deles e confiante sobre o que está por vir.”

A vibrante cerimônia de celebração também teve apresentações de música e dança de Barbados, mas um destaque para muitos teria sido quando a cantora Rihanna foi condecorada uma heroína nacional. Uma enorme comemoração do público surgiu após o anúncio. A primeira-ministra Mottley disse à estrela: “Que você continue a brilhar como um diamante e honrar sua nação com suas obras, com suas ações” – uma referência ao hit de 2021 da estrela pop “Diamonds”.

Oposição à presença de Charles
Os comentários do príncipe foram o mais longe que o Reino Unido já foi no assunto da escravidão, mas não chegaram a um pedido formal de desculpas.

Alguns em Bridgetown questionaram por que o filho da rainha tinha vindo, apontando que a relação histórica da ilha com a coroa estava enraizada na escravidão.

“Nenhum membro da família real deve participar do nosso principal dia de liberdade”, disse o ativista David Denny à CNN.

“A família real se beneficiou financeiramente da escravidão e muitos de nossos irmãos e irmãs africanos morreram na batalha pela mudança”, acrescentou Denny, secretário-geral do Movimento Caribenho pela Paz e Integração.

Uma expedição do rei Jaime I da Inglaterra reivindicou Barbados quando seus navios chegaram pela primeira vez às suas costas em 1625. Um assentamento foi estabelecido dois anos depois.

“Foi o primeiro laboratório para o colonialismo inglês nos trópicos”, disse Richard Drayton, professor de história imperial e global do Kings College London, à CNN.

“Barbados também forneceu uma importante fonte de riqueza privada na Inglaterra dos séculos 17 e 18”, acrescentou ele, observando que muitas famílias inglesas fizeram fortunas substanciais com o açúcar e a escravidão.

Citando essa história, Denny descreveu a participação do Príncipe Charles como “um insulto ao nosso povo” e pediu reparações financeiras da família real, bem como do governo britânico e de outras instituições que lucraram transportando pessoas da África e escravizando-as em plantações em todo o território caribenho.

Scott Furssedonn-Wood, alto comissário britânico em Barbados, disse à CNN: “É evidente que as pessoas na África, nesta região, em todas as partes do mundo ainda sentem aquele profundo sentimento de injustiça e é muito certo que reconheçamos isso, que estamos determinados para que tal coisa nunca aconteça novamente.”

Novo capítulo
A poucos passos do local da cerimônia, na Rua Swan, uma área de compras popular entre os habitantes locais no centro de Bridgetown, muitos barbadianos também saudaram a mudança.

Roger Goodridge, um vendedor de brinquedos de 59 anos, descreveu a mudança para uma república como “uma longa espera” e disse que não ficou surpreso com a visita de Charles.

“O tempo passou para ‘Pequena Inglaterra’. Agora estamos sozinhos e rumo ao nosso maior sucesso – rompendo as águas e passando para outra fase da nossa vida.”

Outros expressaram apoio, mas se perguntaram se a transição foi “um pouco rápida demais”. O governo criou um grupo de 10 membros com a tarefa de ajudar a administrar a transição de um sistema monárquico para uma república em maio deste ano.

“É muito precipitado. Todo mundo ainda não pensou nisso e há tantas pessoas que nem sabem o que é uma república”, disse Andre Moore, 36.

“Eu acho que eles deveriam ter levado pelo menos um ano inteiro para lidar com isso ou pelo menos dois anos. Eu acho que dois anos para realmente pensar sobre isso, resolver o que eles prepararam para toda essa coisa da república.”

Barbados se separou de Rainha, mas ela continua sendo chefe de Estado em 15 países. Os movimentos republicanos nessas nações, sem dúvida, estarão observando a transferência simbólica e esperando que ela aumente o ímpeto de suas próprias campanhas.

O Movimento da República Australiana parabenizou Barbados “por marcar este importante passo em direção à independência total”, disse seu diretor nacional à CNN.

Sandy Biar disse que a soberano de 95 anos sempre disse que cabe a cada nação decidir se e quando deixar a monarquia.

“Barbados mostra que isso pode ser feito mantendo uma relação amigável tanto com a monarquia britânica quanto com o Reino Unido”, acrescentou ela.

A informação é da CNN Brasil.


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