Brasil
Mais de 50 pesquisadores da Capes denunciam descaso na gestão e pedem renúncia coletiva
Profissionais criticam pressão para acelerar abertura de novos cursos, para aprovar ofertas a distância e suposto descaso na retomada da avaliação.
Um grupo de pesquisadores ligados à Capes, órgão do MEC (Ministério da Educação) responsável pela pós-graduação no país, pediu renúncia coletiva. Eles criticam pressão para acelerar ações para abertura de novos cursos, para aprovar ofertas a distância e um suposto descaso da liderança da Capes na retomada da avaliação dos programas. A informação é do jornal Folha de São Paulo.
Três coordenadores e 28 consultores da área de avaliação de Matemática/Probabilidade e Estatística assinam uma carta de renúncia divulgada nesta segunda-feira (29).
Na semana passada, três coordenadores da área de Astronomia/Física já haviam anunciado desligamento também por insatisfação com a presidência da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Outros 18 consultores desse grupo também pediram desligamento.
Até o início da tarde desta segunda, são, portanto, 52 pedidos de desligamento. Há na comunidade científica expectativa de mais pedidos de renúncia. Questionado, o órgão não respondeu até a publicação deste texto.
Esses pesquisadores trabalham nos processos de avaliação do sistema de pós-graduação do país. Os coordenadores são nomeados pela Capes para mandatos de quatro anos e o restante trabalha como assessores nesses trabalhos, todos em atividades não remuneradas mas de importância central no sistema.
Essa empreitada é dividida em 49 áreas de avaliação da pós, organizadas sob 9 grandes áreas temáticas e três colégios. Os pedidos de renúncia se concentram sob o guarda-chuva do Colégio Exatas e da Terra.
Na carta desta segunda, os pesquisadores criticam a Capes por tentar acelerar o procedimento para abertura de novos cursos de pós-graduação sem que a avaliação quadrienal tenha sido finalizada. Esse processo é chamado de APCN (Apresentação de Propostas de Cursos Novos).
“Acreditamos que a Avaliação Quadrienal deve preceder a APCN, já que os parâmetros para o julgamento dos cursos novos dependem da Avaliação”, diz a carta.
Uma decisão judicial de setembro suspendeu a avaliação quadrienal, o que gerou reações na comunidade científica. Os pesquisadores acusam agora a Capes de, enquanto tenta acelerar o processo que abre novos cursos, atrasar o recurso contra a decisão liminar que congelou a avaliação.
“Chama-nos a atenção que a recente tentativa de suspensão da liminar tenha sido apresentada pela Capes sem qualquer urgência, apenas depois de dois meses”, cita a carta. “É quase impossível que a Avaliação Quadrienal seja retomada no futuro próximo.”
Há interesse de instituições privadas de ensino superior em terem aprovados programas de pós-graduação, muitas vezes para garantir status de universidade. Outro interesse, sobretudo do setor privado, é na liberação de cursos na modalidade EAD (ensino a distância).
Isso também é colocado no argumento do pedido de renúncia dos pesquisadores. “Fomos instados a escrever novos documentos a respeito em um prazo de dois dias úteis, depois estendidos em mais uma semana”, diz a carta desta segunda.
O professor da UFC (Universidade Federal do Ceará) Gregório Bessa, um dos coordenadores da área Matemática/Probabilidade e Estatística, diz que a renúncia foi decida após a compreensão que a Capes não mostra interesse em resolver os entraves da avaliação. O mandato deles acabaria no fim do ano mas foi estendido até final de abril.
“A gente renunciou coletivamente para não ser avalista de um situação que não concordamos”, diz ele, que ressalta a impossibilidade de retomar a avaliação quadrienal diante da inércia do órgão nos esforços de reverter a decisão judicial.
“E parece que vem de cima para baixo para regulamentar o EAD, não tivemos possibilidade de dizer que não queremos. Apareceu com pedido curto de fazer documento. Em vez de entregar o documento EAD, decidimos não fazer e renunciar.”
Os coordenadores da área de Astronomia/física também fazem a mesma crítica. “Os motivos elencados no documento são uma atitude de quase inércia da Capes com relação à retomada da avaliação Quadrienal 2017-2020 e a incompreensível pressa em se definir um formato para cursos de PG [pós-graduação] por EAD para a chamada de APCN.”
A presidente da Capes, Claudia Mansani Queda de Toledo, chegou ao cargo em abril por escolha do ministro Milton Ribeiro. Ela enfrentou resistência por causa de seu currículo e por ter nomeado sua aluna de doutorado para diretoria internacional.
O pedido de renúncia na Capes ocorre em paralelo a outro processo de instabilidade em um dos órgãos do MEC. Na véspera do Enem, dezenas de servidores do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) pediram desligamento de seus cargos de chefia após denúncias de assédio moral e pressão para alterar o conteúdo da prova.
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