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Desmatamento na Amazônia: Deputado americano propõe barrar carne, soja e petróleo do Brasil

Já em uma audiência na Comissão de Relações Exteriores, os deputados trataram da crise na Amazônia, focando nas relações entre o governo Trump e o governo Bolsonaro e no papel da China no desmatamento.

Na primeira semana da volta aos trabalhos depois do recesso de verão no Congresso americano, a Amazônia foi tema de duas iniciativas. O deputado democrata Peter DeFazio propôs uma lei para proibir a importação de determinados produtos brasileiros e também a negociação de um acordo de livre comércio com o país. Já em uma audiência na Comissão de Relações Exteriores, os deputados trataram da crise na Amazônia, focando nas relações entre o governo Trump e o governo Bolsonaro e no papel da China no desmatamento.

O projeto de lei de DeFazio fala em barrar a importação de carne, soja, couro, madeira, açúcar, tabaco, papel, milho e petróleo do Brasil. O texto menciona também proibir que o representante de Comércio americano leve adiante negociações de um acordo de livre comércio com o país, devido à “falha do governo do Brasil em combater agressivamente os incêndios na Floresta Amazônia e o desmatamento”.

A proposta, que tem o apoio de outros 14 congressistas, prevê também a suspensão de assistência militar ao país.

“O presidente Jair Bolsonaro acredita que pode agir impunemente e acelerar a destruição da floresta amazônica e ele precisa saber que há consequências no mundo real para suas ações imprudentes”, diz DeFazio.

O encarregado de negócios da embaixada do Brasil em Washington, embaixador Nestor Forster Jr., afirma que esse tipo de iniciativa pode se voltar contra o próprio objetivo de combater o desmatamento. Para ele, punir as empresas que conseguem chegar ao mercado americano é punir o setor da economia que tem o maior índice de comprometimento com a legislação ambiental.

“Eles têm mais condição para isso [obedecer a legislação ambiental], eles têm maior escala pra isso, eles têm equipamento, então cada vez que se coloca uma barreira dessas, o protecionismo disfarçado de meio ambiente, acaba se prejudicando o objetivo que se pretendia alcançar. Então, o que que ficou evidente? A gente quer estímulos, a gente quer premiar quem protege”, disse.

Audiência mais amena

Na audiência na Câmara dos Representantes, o tom foi mais ameno e menos combativo com relação às ações a serem tomadas pelos Estados Unidos. Os deputados presentes — quatro democratas e três republicanos — questionaram três especialistas convocados sobre temas prioritários da política externa americana que vão além do meio ambiente, como comércio com a China e a aproximação de Trump do governo Bolsonaro de um modo geral.

O deputado democrata Albio Sires, presidente da subcomissão que convocou a audiência, por exemplo, disse que a ideia não é apontar culpados ou legislar sobre o Brasil, e sim “descobrir o que podemos fazer trabalhando juntos para ajudar a parar o desmatamento”. “Você não pode só dizer ao governo ‘faça isso, faça aquilo’, precisa ser uma abordagem de dar e receber e isso levará a algum tipo de entendimento”.

Sires citou a questão do aumento da venda de soja brasileira à China em decorrência da guerra comercial entre o país asiático e os Estados Unidos. O republicano Ted Yoho focou na questão da importação de madeira ilegal pela China, apesar de o diretor de políticas da International Conservation Caucus Foundation, Bill Millan, afirmar que não tem conhecimento de que essa madeira seja exportada do Brasil.

Para o republicano Francis Rooney, a ideia é discutir como equilibrar o impacto positivo que a Amazônia tem nas mudanças do clima e no mundo “sem prejudicar as capacidades dos brasileiros de desenvolverem seu país”, citando a possibilidade de criação de “certificados verdes”.

O democrata Joaquim Castro se mostrou preocupado com o “comportamento errático” do presidente Jair Bolsonaro e citou o desentendimento com o presidente francês, Emmanuel Macron, e os comentários do presidente sobre a primeira-dama francesa, Brigitte Macron.

Apesar de as apresentações terem focado na Amazônia brasileira, o deputado Juan Vargas citou a questão do uso de terras amazônicas para produção de entorpecentes. “Espero que as pessoas que usam drogas entendam o prejuízo que levam à floresta, porque não podemos só olhar para os fazendeiros, tem também as pessoas que usam cocaína”.

Respeito a soberania

Na audiência, os congressistas não pareceram dispostos a propor um boicote a produtos brasileiros por parte do governo ou a barrar um acordo de livre comércio. O democrata Dean Phillips disse que não considera, no momento, barrar um acordo, mas acredita que há desafios e que todas as opções devem ser levadas em consideração.

“O Brasil é um país soberano, respeito isso. Mas isso tem implicações. A política ambiental não é mais uma política doméstica por si só, é uma política internacional. E é por isso que estou decepcionado que os Estados Unidos não estejam mais no Acordo de Paris e acredito que devemos usar todas as ferramentas disponíveis para nós para afetar mudanças políticas bem pensadas para preservar e proteger o mundo”, disse.

Phillips também perguntou, durante a audiência, se era uma coincidência que o presidente Jair Bolsonaro tenha sido eleito em uma plataforma com apoio do setor agropecuário.

O presidente da Earth Innovation Institute, Daniel Nepstad, disse que, apesar de o desmatamento estar chegando a um momento em que os danos podem ser irreversíveis, ele é também fruto de frustrações no país e do sentimento de que o Brasil fez sua parte para mitigar as mudanças do clima com ações e engajamento em acordos internacionais. Para ele, este não é um momento para se afastar de acordos de comércio, e sim para “mandar um sinal de que, se o Brasil continuar em seu caminho histórico de reduzir o desmatamento, haverá benefícios reais”.

“Nós estamos em um momento muito volátil no Brasil em que ações unilaterais que ameacem o mercado com retaliações ao comércio pode realmente ter o efeito contrário”, disse.

A diretora do programa de Estudos Latino-Americanos da Johns Hopkins University e colunista da revista Época, Monica de Bolle, que também participou como especialista a dar seu depoimento, diz que o saldo da audiência é positivo e que foi sinalizada “uma preocupação claríssima dos deputados”.

“Embora a presença dos democratas tenha sido maior do que a presença dos republicanos, acho que, dos dois lados, há uma preocupação enorme com o que está acontecendo na Amazônia neste momento e uma preocupação construtiva”, disse.

A economista também acredita que um acordo de comércio firmado entre Brasil e Estados Unidos deverá necessariamente incluir normas sobre meio ambiente, como foi feito na renegociação do NAFTA pelo governo Trump.

“Qualquer acordo que venha a ser firmado com o Brasil, seja um acordo de facilitação de comércio ou algo mais ambicioso, vai conter essas normativas, essas exigências. Isso é comércio no século XXI”, disse.

O embaixador Nestor Forster Jr. diz que a audiência foi “muito equilibrada” e abordou a “complexidade dos temas envolvidos”. Forster Jr. também afirmou que é parte da rotina da embaixada manter uma ponte com congressistas de ambos os partidos, Republicano e Democrata.
“Isso é o resultado do trabalho da embaixada aqui, um trabalho de diplomacia parlamentar. (…) É um trabalho junto aos assessores dos parlamentares, é um trabalho junto aos deputados e senadores dos dois partidos, sempre, independentemente de qual é a minoria e a maioria”, disse.


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