Amazonas
Diretores da Aneel descumprem ordem de juíza e situação do fornecimento de energia no Amazonas sofre impasse
a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não foi capaz de chegar a um consenso em relação à transferência de controle da Amazonas Energia e da conversão de contratos de energia para reserva de capacidade.
No mais recente capítulo da novela que envolve a transferência de controle da distribuidora Amazonas Energia e embates entre diretores da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o colegiado resolveu descumprir uma decisão judicial, colocando o fornecimento de energia no Estado do Amazonas em risco.
Num placar de 2×2, os diretores Fernando Mosna e Ricardo Tlli se posicionaram contra o cumprimento de uma sentença judicial, se opondo à decisão da juíza federal Jaíza Fraxe, que havia determinado a passagem do controle acionário da distribuidora para a Âmbar Energia, do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista.
Na reunião extraordinária, marcada para deliberar sobre a decisão da juíza federal, os diretores analisaram se acatariam pontos da sentença. O principal era se cumpririam a determinação de aprovar a transferência acionária do grupo Oliveira Energia para o consórcio Futura Venture Capital e o Fundo Milão, ligados aos Batistas.
Com o empate, a Aneel acabou não cumprindo a decisão judicial que deu prazo de 48 horas para resolver a questão, até a última sexta-feira. Diante disso, o diretor-geral, Sandoval Feitosa, que se mostrou favorável ao cumprimento da sentença junto com a diretora Agnes Costa, disse que tentaria explicar a situação à juíza, alegando que o governo tem demorado para nomear o quinto diretor da Aneel, o que pode acabar com o impasse existente na agência.
Em um claro movimento de tentar jogar a bola para o governo, em especial para o ministro Alexandre Silveira, Sandoval disse, segundo apurou a coluna, que iria encaminhar os votos para a juíza tentando explicar que a Aneel não chegou a uma decisão em função da agência não ter o quinto diretor.
Procurado, o Ministério de Minas e Energia (MME) emitiu nota dizendo que “o impasse da Diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica, na verdade, não se dá em razão da falta de indicação de um quinto nome para a agência, mas por decisões deliberadas de diretores de descumprirem sentença proferida por juíza federal, em total afronta à lei, ao estado democrático de direito e ao poder judiciário”. A coluna procurou a Aneel oficialmente, mas não obteve resposta.
Ao mesmo tempo, o MME diz que a indicação do nome para a quinta vaga da Aneel já foi feita há meses. Nos bastidores, o nome do secretário de Energia Elétrica de Silveira, Gentil Nogueira, é tido como certo para a vaga, mas a costura com o Senado ainda não está completa.
Segundo Leitão, a agência tem se tornado foco de atenção pelas brigas entre diretores, indicados ainda no governo Bolsonaro, e pelos impasses criados a partir de interesses políticos, incluindo episódios que contam com cenas de choro, protestos acalorados e agressões verbais.
De um lado, Mosna e Tili são ligados ao senador Marcos Rogério, do PL de Rondônia, tendo laços com empresas de geração térmica a gás na região Norte. Do outro, o piauiense Sandoval figura como homem de confiança do conterrâneo e ex-ministro da Casa CivilCiro Nogueira, unindo forças com Agnes, afilhada do ex-ministro – e carregador de joias – Bento Albuquerque.
Enquanto os diretores não se entendem e a quinta vaga não é definida a população do Amazonas vive momentos de incerteza. Fato é que a pressão política e da justiça está cada vez maior sobre a agência e sobre o governo. Uma solução pode evitar que a população do Estado fique no escuro.
Para entender
Em reunião extraordinária realizada nesta sexta-feira (27/9), a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não foi capaz de chegar a um consenso em relação à transferência de controle da Amazonas Energia e da conversão de contratos de energia para reserva de capacidade.
Uma liminar concedida pela Justiça Federal do Amazonas determinava que a agência aprovasse até esta sexta-feira (27) a aquisição da distribuidora de energia pelo grupo J&F.
Após a confirmação do impasse, o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, afirmou que comunicaria a Justiça Federal sobre a complexidade do caso e de que não foi possível chegar a uma definição.
Para que o plano fosse aprovado, os diretores precisariam apreciar o plano de transferência apresentado pela Âmbar Energia.
Em análise da área técnica, houve a recomendação de que a operação não fosse autorizada, por falta de detalhamento de medidas para equacionar a dívida da distribuidora de energia.
O relator do caso, Ricardo Tili, criticou a liminar, por acreditar que a Justiça extrapolou a competência ao determinar uma direção à agência.
“Não me resta interpretar de outra forma, senão que a decisão judicial determina que a Aneel cometa um ato ilegal ao aprovar o plano de transferência na forma como proposto pelos pretensos controladores”, disse.
Mesmo assim, Tili propôs que a proposta da Âmbar fosse aceita mediante um termo aditivo a ser assinado em até 24 horas após a decisão da diretoria.
O diretor Fernando Mosna acompanhou o entendimento por entender que a decisão judicial estabelecia que a proposta original deveria ser aprovada pela agência.
Em voto separado, a diretora Agnes da Costa defendeu que fosse aceito o plano de transferência de controle apresentado na quinta-feira (26).
“Aprovar a proposta original, tendo o agente protocolado em 26 de setembro nova proposta menos danosa ao consumidor, contraria diversos princípios fundamentais, como a legalidade, razoabilidade, interesse público, economicidade e eficiência”, argumentou.
O diretor-geral concordou com a posição. Com os posicionamentos, a votação permaneceu empatada, impossibilitando uma decisão em cumprimento da liminar judicial.
Em nota, a Âmbar Energia informa estar confiante de que a solução proposta será aprovada, após ter apresentado um novo plano para a transferência de controle.
Segundo a empresa, a proposição “amplia significativamente os benefícios para os consumidores de energia ao mesmo tempo em que permite o complexo equacionamento da crise enfrentada pela distribuidora”.
A diretoria colegiada também se manteve dividida em relação à conversão de contratos de compra e venda de energia, assumidos pela Amazonas Energia, a contratos de energia de reserva.
A medida é importante para a sustentabilidade financeira da distribuidora de energia, já que havia acordos de fornecimento de usinas termelétricas, anteriores à conexão do estado ao Sistema Interligado Nacional.
Com a migração de indústrias ao mercado livre, a Amazonas Energia tinha um excesso de geração de energia nos contratos vigentes.
A J&F adquiriu 11 usinas termelétricas da Eletrobras no Amazonas, tornando-se o terceiro maior gerador a gás do Brasil. Como existiam débitos da Amazonas Energia junto à companhia, a transação passaria pela aquisição da distribuidora de energia.
A negociação da Âmbar incluiu as usinas termelétricas de Mauá III (591 MW), Aparecida (166 MW), Anori (5 MW), Codajás (5 MW), Anamã (2 MW), Caapiranga (2 MW) e um conjunto de produtores independentes de energia (PIEs) controlados por terceiros – e que somam 600 MW.
A Medida Provisória 1232/2024, que trata da recuperação da Amazonas Energia, permite que essas térmicas passem ser remuneradas por todos os consumidores do SIN, por meio dos contratos de energia de reserva.
O relator do processo, Fernando Mosna, demonstrou preocupação em relação ao caso de uma das térmicas, que, segundo ele, poderia gerar problemas no fornecimento, caso fosse convertido a um contrato de energia de reserva.
“Fazer a conversão da UTE Aparecida pode eventualmente fazer com que a Amazonas Energia passe de sobrecontratada para subcontratada. O objetivo exposto era reduzir a sobrecontratação, mas não acarretar subcontratação”, afirmou.
Nesse processo, houve a mesma configuração do impasse. De um lado Mosna e Tili partilharam do mesmo entendimento, enquanto Costa e Sandoval tiveram a mesma visão.
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