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Amazonas

MPF aponta risco de salinização de rios e pede suspensão de licença a potássio no Amazonas

O pedido à Justiça Federal, feito em uma ação com caráter urgente, protocolada no fim da tarde desta segunda-feira (13), é assinado por cinco procuradores da República.

O Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas pediu a suspensão da licença de instalação concedida pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) ao projeto de exploração de potássio na região de Autazes (AM), entre os rios Madeira e Amazonas. O pedido à Justiça Federal, feito em uma ação com caráter urgente, protocolada no fim da tarde desta segunda-feira (13), é assinado por cinco procuradores da República, informou a Folha de S. Paulo.

A ação se estende a outras licenças concedidas ao empreendimento, como para construção de um porto e para captação de água. O MPF quer que os efeitos dessas autorizações sejam suspensos, com impedimento de obras que deem início às atividades de exploração mineral.

Outro pedido da Procuradoria é para que o processo de licenciamento seja encaminhado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), por haver sobreposição de jazidas a um povoado indígena existente há pelo menos 150 anos.

Em nota, a Potássio do Brasil, dona do empreendimento, afirmou que ainda não tomou conhecimento do conteúdo da ação e que irá se manifestar nos autos do processo.

O Ipaam não respondeu aos questionamentos da reportagem.

O estudo do componente indígena (ECI), protocolado pela Potássio do Brasil, aponta a existência do povoado mura há 150 anos, segundo a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). O MPF diz que esse período é ainda maior, de 200 anos.

A ação protocolada na Justiça Federal lista diversas razões para a suspensão das licenças concedidas. A mais importante, a de implantação de mina e lavra, foi concedida pelo órgão do governo do Amazonas no último dia 5 de abril.

Segundo o MPF, foram identificadas “irregularidades graves”, que “colocam em risco o meio ambiente, os povos indígenas e toda a população que utiliza ou depende de alguma forma do rio Amazonas, em especial em toda região do empreendimento da Potássio do Brasil”.

Há projeção de que milhões de toneladas de sal —o rejeito retirado junto com a silvinita— serão colocados ao ar livre nos primeiros anos de exploração, exposto “em plena floresta amazônica”, conforme a Procuradoria da República no Amazonas.

“A pilha de rejeitos foi projetada para situar-se em área inundável, a despeito dos riscos de contaminação da água (e dos ecossistemas associados) com a salmoura”, afirma a ação. “Há riscos de salinizar nascentes, lagos, igapós, igarapés e rios da bacia do Amazonas, o que pode gerar consequências imprevisíveis.”

O estudo de impacto ambiental tem falhas e não é possível precisar todos os danos a que a área está sujeita, conforme o MPF.

As jazidas estão em área onde vivem cerca de 500 muras. Em agosto, a Funai criou um grupo técnico para análise da demarcação da terra Lago do Soares e Urucurituba, uma reivindicação antiga dos indígenas. O órgão federal pediu a suspensão do licenciamento enquanto realiza os estudos, e foi ignorado pelo Ipaam, a exemplo do que ocorreu outras duas vezes.

A exploração de potássio ficaria próxima de outros dois territórios tradicionais, segundo o MPF: a menos de 3 km da terra Jauary e a 6 km da terra Paracuhuba. “Isto sem contar a parte da exploração no subsolo que se encontra praticamente junto às duas terras indígenas”, cita a ação.

Não houve consulta livre aos indígenas sobre o empreendimento, e mais de 700 muras se reuniram em assembleia no fim de 2023 para protestar contra fraudes, afirmam os procuradores.

A ação aponta ainda a ocorrência de fracionamento das licenças ambientais, que “não permite verificar com segurança e transparência os riscos do empreendimento”. “O próprio Ipaam, num de seus documentos internos, confessa que optou agir dessa forma fracionada para não atrasar muito o licenciamento, argumento que é totalmente ilegal.”

O MPF afirma ainda que “o processo de cooptação, pressão e oferta de dinheiro segue a pleno vapor contra o povo mura”. Há ameaças e risco de morte de lideranças, que pediram inclusão em programa de proteção de testemunhas, conforme a Procuradoria.

Em novembro do ano passado, reportagem da Folha mostrou que o presidente da Potássio do Brasil, Adriano Espeschit, prometeu a muras a compra e entrega de 5.000 hectares de terras em caso de posição favorável ao empreendimento de exploração de potássio.

A oferta, feita numa assembleia de uma pequena parte dos muras em setembro, foi seguida de falas de Espeschit contrárias à demarcação do território, apesar do início de procedimentos formais para a delimitação por parte da Funai.

O presidente da Potássio do Brasil disse ainda aos muras que o território só poderia virar terra indígena ao fim da retirada do minério, num prazo de 23 a 34 anos. Em nota, a empresa afirmou que os benefícios aos muras já eram públicos.

No último sábado (11), reportagem mostrou que o Ipaam distorceu o prazo da portaria da Funai sobre os estudos para a demarcação, com o propósito de conceder a licença de instalação. Além disso, o órgão do governo do Amazonas não se manifesta desde 2015 em processo sobre as questões indígenas do licenciamento, segundo a Funai.

Nesta segunda (13), a Folha contou que o Ibama afirma, em documento do segundo semestre de 2023, que pode assumir o licenciamento do projeto, a partir do momento em que for concluído o relatório de identificação da terra indígena. Atos do Ipaam podem ser revistos, disse o órgão federal.

O governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), fez um evento para anunciar a concessão da licença de instalação à Potássio do Brasil, pertencente a CD Capital, Sentient e Forbes & Manhattan (do empresário canadense Stan Bharti), entre outros acionistas.

Lima disse que a exploração de potássio vai gerar 2.600 empregos diretos e beneficiar os muras. Em seus discursos, ele ignora a oposição ao projeto de parcela expressiva dos indígenas.

O governo Lula (PT) apoia o projeto. O discurso de apoio é o mesmo do governo de Jair Bolsonaro (PL): o potássio é base para fertilizantes utilizados na agricultura em larga escala, e o empreendimento é necessário para diminuir a dependência do país à importação de fertilizantes. O principal defensor no governo é o vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB).

Segundo o governo, o Brasil importa 95% do cloreto de potássio usado em fertilizantes. O projeto em Autazes pode atender 25% do consumo nacional, conforme dado da empresa citado em manifestações da União à Justiça Federal.


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